Editorial 137
A prova por amostragem é aquela por meio da qual se prova uma universalidade
de eventos a partir da prova de parte deles. Isso porque, como consta no Manual
for Complex Litigation, uma publicação oficial do Poder Judiciário
norte-americano, métodos estatísticos podem normalmente estimar, com
determinado nível de segurança, as características da “população” ou “universo”
de eventos, transações, atitudes ou opiniões, por meio da observação das
características em um segmento pequeno ou simples da população (Manual for
Complex Litigation, Fourth, § 11.493, p. 102 (Disponível em
https://public.resource.org/scribd/8763868.pdf, consultado em 04.03.2012, 08h).
Ela pode ser considerada uma variante da prova estatística.
A prova por amostragem pressupõe a existência de um conjunto de
eventos/fatos que possam ser agrupados, porque semelhantes, de forma que a
prova de parte deles possa conduzir o magistrado ao juízo acerca da existência
de todos eles. A prova de parte do conjunto de fatos conduz à conclusão da
existência acerca de todos os fatos que compõem esse mesmo conjunto.
A prova por amostragem relaciona-se com a prova indiciária.
Na prova indiciária, o indício não é o fato probando principal – embora se
tenha de prova o indício, o objeto principal da prova é o fato que o indício
aponta; o fato ao qual se liga o indício. O indício é o fato conhecido que, por
via de raciocínio, sugere a existência/inexistência do fato probando principal.
Entre o indício e o fato probando principal há uma relação lógica de
causalidade, que autoriza a atividade do juiz (presunção judicial) de concluir
existente o fato probando principal. Na prova indiciária, há uma relação lógica
entre o fato conhecido (indício) e o fato que se quer provar. Essa relação
permite que se faça um silogismo, conforme visto.
Na prova por amostragem, os fatos provados são também fatos probandos –
servem como indícios –, mas, por meio da sua prova, pretende seja realizado
juízo acerca da existência de todos os fatos pertencentes ao conjunto. A prova
dos fatos da “amostragem” autoriza a presunção acerca dos fatos que não compõem
a “amostragem”. Nesse sentido, caso se realize a atividade da presunção, nenhum
dos fatos que compõem o conjunto pode ser considerado não provado, pois seria
ilógico. Todos os fatos pertencem ao conjunto justamente porque existe relação
de forma constante ou ordinária entre eles. Por meio da prova de determinados
elementos, surge a presunção acerca de todos eles, considerados em sua
universalidade.
A relação de conteúdo/continência também permite que se faça um silogismo,
no qual também ganham relevância as máximas de experiência, para que se
constate a existência da relação entre os fatos componentes do conjunto.
Premissa maior: máxima da experiência, noção que reflete o reiterado
perpassar de uma série de acontecimentos semelhantes, autorizando, mediante
raciocínio indutivo, a convicção de que, se assim costumam apresentar-se as
coisas, também assim devem elas, em igualdade de circunstâncias, apresentar-se
outras – possuem as características da generalidade e abstração.
Premissa menor: a relação entre fatos para que sejam tidos como componentes
de um conjunto. A relação entre eles será também de constância ou
ordinariedade, justificando a formação, na lógica do pensamento, do conjunto.
Com o auxílio da experiência, pode-se concluir que todos aqueles fatos são
componentes do conjunto. Após esta conclusão, dado que uma série de fatos do
conjunto exista – e aqui a experiência atua mais uma vez –, conclui-se que
todos eles existem. É a presunção.
O raciocínio só será legítimo se os métodos de amostragem forem utilizados
de acordo com os padrões gerais de estatística, como se depreende do Manual for
Complex Litigation. São fatores relevantes que devem ser levados em
consideração: (i) se a ”população” foi propriamente escolhida e definida; (ii)
se a amostragem escolhida foi representativa da população; (iii) se os dados
reunidos foram cautelosamente relatados; e (iv) se os dados foram analisados de
acordo com as os princípios de estatística aceitáveis (Manual for Complex
Litigation, Fourth, § 11.493, p. 102/103).
As normas da estatística são, aqui, meios ao alcance da “confiabilidade” da
conclusão da atividade da presunção. Michelle Taruffo trata das funções dos
“conhecimentos científicos” quando se refere ao juízo prognóstico de fatos
futuros. Suas lições aplicam-se, mutadis mutandis, ao que ora se chama de
“prova por amostragem”, para considerar que os esquemas “probabilísticos” são
adaptados para munir o juiz de estruturas lógicas validamente utilizáveis,
atribuindo um grau considerável de confiabilidade e probabilidade de suas
previsões (TARUFFO, Michele. Sobre as fronteras. Escritos sobre la justicia
civil. Bogotá: Editorial Themis, 2006, p. 314-315), aqui com relação aos fatos não
diretamente provados.
Na prova por amostragem, exige-se, pois, que o conjunto seja definido para
que os seus elementos guardem relação de constância ou ordinariedade. Demais
disso, os fatos constantes da amostragem devem ser significativos para que, no
segundo momento de atuação da experiência, se possa realizar a presunção com
relação ao todo.
A prova por amostragem/estatística pode ser muito útil no processo. Técnicas
aceitáveis de amostragem podem economizar tempo e reduzir custos e, em alguns
casos, promover a única forma viável de coletar e apresentar um dado relevante
– diminui-se o objeto da prova: em vez da apresentação de volumosos dados de
toda população, apresentam-se dados de apenas parte desta população. A prova
por amostragem atende, pois, ao princípio da economia processual e, em alguns
casos, é uma saída para que se evite a existência de prova diabólica.
A ausência de previsão expressa em nosso direito processual não significa
que não se admita a prova por amostragem no processo. Os fatos podem ser
evidenciados por qualquer meio de prova, ainda que não previsto na lei, desde
que se trate de um meio lícito e moralmente legítimo (art. 332, CPC). Assim, ao
lado dos meios de prova típicos, que contam com expressa previsão em lei,
admitem-se os meios de prova atípicos, que não encontram sede legal.
A prova por amostragem é outro exemplo de prova atípica. A ausência de
disciplina legislativa exige que o juiz atente, no momento da sua produção,
para os princípios que norteiam a teoria geral da prova, sobretudo os princípios
do contraditório e da ampla defesa.
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