Ricardo Eletro é condenada por conduta homofóbica de gerente
A
Ricardo Eletro Divinópolis Ltda. foi condenada a indenizar em R$ 30 mil
por dano moral um vendedor vítima de ofensas homofóbicas cometidas por
um gerente de vendas de uma das lojas da rede, em Vitória (ES). A
decisão unânime da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho de negar
provimento a agravo da empresa confirmou a condenação imposta pela
Justiça do Trabalho da 17ª Região (ES): além da indenização, a loja
deverá arcar, durante um ano, com pagamentos mensais de R$ 250 para
auxiliar o vendedor na compra de medicamentos para tratamento de
depressão.
Assédio moral
O
vendedor relata na inicial de sua reclamatória trabalhista que foi
contratado, em novembro de 2009, como terceirizado para trabalhar como
vendedor na unidade da Ricardo Eletro no Shopping Vitória (ES). Devido a
seu desempenho satisfatório, em fevereiro de 2010 foi efetivado pela
rede na função de vendedor.
Segundo
seu relato, desde o início foi tratado com rigor excessivo pelo gerente
de vendas. Na segunda semana de trabalho, durante treinamento da
equipe, ele insinuou na frente de colegas de trabalho que o vendedor era
gay, e passou a tratá-lo com palavras grosseiras, a dizer que "tinha
voz de gay" e a fazer brincadeiras de mau gosto – como a de citar seu
nome e dizer que, à noite, ele se chamava "Alice no País das
Maravilhas".
O
vendedor afirmou que era coagido pelo gerente a atingir metas de venda
de forma grosseira, com insinuações sobre homossexualidade e uso de
drogas, e que era chamado de "lerdo, incompetente, moleque, sem
dignidade". Alegou que era ameaçado de despedida caso não atingisse a
meta exigida.
O
modo como era tratado na frente de clientes e colegas desencadeou,
segundo ele, um processo de depressão, o que o levou a procurar ajuda
especializada e a usar medicamentos e apresentar atestados. Toda vez
que ia entregar os atestados, o gerente o ameaçava de demissão na frente
de clientes e colegas, e alguns de seus atestados não foram aceitos
pelo setor de recursos humanos da loja.
Diante
disso, ingressou com a ação trabalhista ainda no curso do contrato de
trabalho pedindo sua rescisão indireta – situação em que o trabalhador é
quem toma a iniciativa da demissão, mas, por justa causa, o empregador
tem de pagar todas as verbas rescisórias devidas –, indenização por dano
moral pelo constrangimento a que foi exposto e ajuda de custo para
compra de remédios para tratamento de depressão.
Contestação
A
Ricardo Eletro, em sua defesa, argumentou que, em momento algum, os
prepostos ou superiores hierárquicos do vendedor o trataram com rigor
excessivo ou mesmo praticaram ato lesivo a sua honra e boa fama. Segundo
a rede de lojas, as afirmações do empregado "não eram verdadeiras,
imediatas e nem graves o suficiente para justificar o rompimento do
pacto por justa causa do empregador".
A
empresa negou as ameaças de demissão, e sustentou que o trabalhador
estaria forçando a sua saída com o objetivo de receber as verbas
rescisórias, apresentando como justificativa "fatos totalmente
inverídicos". Quanto ao pedido de ajuda de custo para compra de
remédios, alegou não ser a causadora da doença que acometeu o vendedor.
Condenação
Para
a 9ª Vara do Trabalho de Vitória, ficou demonstrado, com base nos
depoimentos, que de fato o vendedor foi tratado de forma discriminatória
e homofóbica, gerando o quadro de depressão "com evidentes prejuízos
financeiros". A sentença cita um dos depoimentos, segundo o qual o
vendedor, que era o melhor da equipe, "teve uma queda muito grande nas
vendas e era encontrado deprimido no fundo da loja". Outra testemunha
disse que o vendedor teria confidenciado que sua depressão se devia a
"problemas com a gerência e relacionados à discriminação".
A
sentença considerou que houve assédio moral por parte do preposto da
empresa, sendo, portanto devido o pagamento de indenização por danos
morais no valor de R$ 30 mil. Deferiu, também, o pedido de rescisão
indireta e o pagamento das verbas decorrentes, além da ajuda de custo de
R$ 250 mensais durante um ano devido à depressão.
O
Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região manteve a condenação na sua
integralidade, confirmando que o vendedor sofria ofensas e humilhações
de conotação homofóbica, "com brincadeiras desrespeitosas, degradantes e
extremamente ofensivas" que ofendiam seu direito à liberdade e à vida. A
decisão regional cita o relato de uma das testemunhas: o gerente teria
dito que, se dependesse dele, o vendedor deveria trabalhar no setor de
portáteis, onde só trabalham mulheres. A mesma testemunha narrou que o
gerente teria dito que jamais beberia água de uma garrafa da qual o
vendedor tinha se servido, "situação em que todos riram".
Contra
a decisão, a Ricardo Eletro interpôs recurso de revista ao TST, cujo
seguimento foi negado pela presidência do Regional. Dessa forma,
ingressou com o agravo de instrumento julgado pela Segunda Turma, que
manteve o entendimento do Regional e indeferiu o processamento do
recurso de revista.
Segundo
o relator do agravo, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, os depoimentos
confirmaram o assédio moral e a discriminação ao vendedor "em razão de
sua opção sexual". Para ele, a atitude da empresa violou "a dignidade, a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem" do trabalhador,
ofendendo "os princípios da dignidade da pessoa humana e da valorização
do trabalho humano".
Para
o ministro, o valor fixado em sentença e mantido pelo Regional
respeitou os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, e levou
em conta o caráter punitivo e pedagógico da punição e o dano causado ao
vendedor. Ficou evidente, ainda, para o relator, a necessidade de
manutenção da ajuda de custo para a aquisição de medicamentos. A decisão
foi unânime.
(Dirceu Arcoverde/CF)
Processo: AIRR-64100-89.2010.5.17.0009
Com certeza as testemunhas tiveram papel fundamental neste caso, pois dano moral é muito difícil de se provar, principalmente no ambiente de trabalho.
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